A mais estranha forma de prazer

Cada um sabe do tesão que tem. Há quem curta levar tapa, trepar todo amarrado/amarrada, ou só olhar outras pessoas tranzando. Tem quem goste de mandar fotos de si mesmo/mesma sem roupa para sites aleatórios nessa internet véia sem porteira, tem quem goste de escrever fanfics eróticas com Jesus, e quem fica excitado/excitada vendo essas coisas. Tem gente que morre de tesão em xeretar e-mail dos outros. Tem até quem se derreta de prazer tirando casquinha de machucado.

Mas nenhuma dessas taras, nem gente que curte se lambuzar de bosta na hora do sexo, me impressiona tanto quanto o indivíduo que sente prazer corrigindo os outros.

Já tentaram me dizer que essas pessoas têm é doença, mas não acho não. É tesão mesmo. Que outra coisa explica a busca incessante dessas pessoas por um errinho que seja, um deslize qualquer que alguém dê, só para poder apnotar, dizer que viu, dizer que aquilo está errado? Se doença fosse, a pessoa sofreria com isso, buscaria tratamento, tentaria não ser mais a chata. Para continuar sendo a mala que corrige os outros, só gostando muito. Só sentindo prazer.

Esses fetichistas de erros gramaticais, gafes e desatenção alheias estão por todos os lado, embora pareça uma tara mais incomum do que lamber olho.

Como não existe uma sex shop voltada para este nicho, as pessoas que sentem tesão em corrigir os outros acabam tendo que buscar na internet material para saciar os seus estranhos desejos. Vale notar que apenas apontar um erro com a finalidade de ajudar outra pessoa não só não é suficiente para satisfazê-los, como não é, de forma alguma, a intenção desses sádicos.

Eles gostam de alardear o erro, de fazer aqela crase usada no lugar errado ficar maior do que o mundo, de apontar para a referência que você esqueceu de colocar, de reclamar do tema de que você não falou. E fazem isso para humilhar, constranger, mostrarem-se superiores, sabidões, paladinos da gramática que são. Nem a mais malvada dominatrix se coloca nessa posição, já que entre quem é corrigido e quem é submisso existe uma diferença básica: o submisso quer (e gosta de) ser submisso.

De consensual, aliás, essa tara não tem nada. Esses pentelhos vão importunar você ao menor deslize, você gostando ou não você querendo ou não entrar na onda deles. Não há safe-word que o proteja. Aliás, se safe-word não estiver em itálico e grafado corretamente, que deus nos proteja.

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Eles gozam quando pegam algo que certamente deu muito trabalho para alguém e acham o mínimo, o mais indetectável, o mais banal errinho. E, por serem do tipo exibicionistas, esfregam esse errinho na cara dos outros, para todo mundo ver, até que a baba comece a escorrer, até que suas pernas fiquem trêmulas e suas roupas íntimas todas meladas.

Essas pessoas devem se masturbar com um livro de gramática. Não LENDO o livro de gramática, mas usando o próprio livro, sabe? Como? Ah, sei lá. Imagina aí.

É lógico que essas pessoas que sentem esse tesão incontrolável em corrigir os outros publicamente não precisam ser lá especialistas em nada. Elas não percebem os erros mais do que a média da população mundial ou têm mais conhecimento para entender o que constitui um defeito ou um erro; geralmente, elas corrigem o que qualquer idiota é capaz de identificar como um erro, com a diferença que a maioria das pessoas simplesmente prefere ignorar. Afinal, o que é aquela vírgula extra no grande esquema das coisas?

Fica até difícil entender como é que essas pessoas ficam tão fissuradas em humilhar os outros por deslizes que qualquer criatura não muito inteligente é capaz de perceber, mas tesão não precisa fazer sentido, né?

Dizem, mas não é nada comprovado, que essa tara (ao contrário de outras, que, por mais estranhas que sejam, não são prejudiciais como esta) é causada, geralmente, por falta de abraço. Mas é claro que, quanto mais o tarado por erros corrige os outros, menos chances ele tem de ganhar um abraço. É um ciclo.

Na falta de uma religião que condene esta prática imoral, resta ter que aturar todo tipo de maluco gemendo de prazer às custas das correções dos nossos descuidos. No caso de você ser uma destas pessoas com esta peculiar tara, tenho um conselho: largue essa vida e empregue essa minúcia para enxergar detalhes à procura dos mais ínfimos erros em favor de algo mais proveitoso e igualmente prazeroso. Vá catar piolhos.

1. No texto acima, eu plantei exatamente 13 errinhos. Se você os descobriu e sentiu aquele ímpeto de corrigir, parabéns: este texto é para você.

2. Adendo necessário: como tem outro tipo de tarado muito comum na internet (o que sente tesão em dizer que você pensa exatamente aquilo que você NÃO disse no texto), acho bom deixar claro: não sou contra a correção em si. Mas se é com a intenção de ajudar (coisa que os compulsivos por corrigir publicamente não têm), ela é feita igual amorzinho gostoso: com jeitinho e entre quatro paredes.

Fotografia da capa: Jeanny // Flick Creative Commons