Imitação da imitação

Tudo é uma cópia de uma cópia de uma cópia, já diria o narrador de Clube da Luta.

Essa frase tem estado em tudo que vejo, e a sensação de viver num dejá-vu não me abandona. As propagandas da TV que não vejo mais se parecem com os clipes descolados de músicas cujas letras se parecem com textão de militância. As frases e piadas e observações sagazes que as pessoas jogam nas conversas se parecem demais com o meme da semana do Twitter, talvez porque sejam mesmo. O jeito de falar, o jeito de fotografar, a forma de escrever, tudo igual.

De 15 em 15 segundos, até os vídeos que as pessoas gravam em seus stories já são todos parecidos, moldados na mesma forma em que são feitos os vídeos de influencers que falam para milhões.

Normal: é a referência que elas têm. É o que elas consomem, logo, é o que elas vão reproduzir.

Tudo é um remix. Nada é criado do nada. Os ingredientes da nossa criação vêm do mundo ao nosso redor, de outras criações. Recombinamos ideias existentes, pegamos um pouco dali, adaptamos um pouco acolá. Assim surgem as coisas novas.

Mas usar referências para criar algo é diferente de copiar. É diferente de só reproduzir.

Reproduzir é um ato mecânico, feito sem muito propósito. Fazer igual, só porque os outros estão fazendo. Não se origina nada novo disso, no máximo se extravasa um pouco desse impulso por se expressar, por obter um pouco de atenção. 

Como o estranho fenômeno da galera no Twitter que simplesmente copia um tuíte bem-sucedido, sem mudar uma vírgula, só para gozar com RT’s de 4 ou 5 dígitos. Números e corações que não significam nada, que valem o mesmo que dinheiro de Banco Imobiliário.

O que vejo são pessoas tentando copiar o RESULTADO: a vitória, os milhares de seguidores, a fama. Copiar o mesmo método que essas “pessoas inspiração” usam parece o suficiente para chegar lá. Mas já não estamos mais nos anos 90 para acreditarmos que basta nos lambuzarmos de Monange para virarmos a Xuxa. Para, não dá.

Onde estamos indo com tudo isso? Para onde queremos ir?

A resposta cabe a cada um encontrar. Mas não é no perfil do influencer que ela vai estar, nem no trabalho do coleguinha ao lado, nem copiando o passo a passo daquele tutorial no Youtube.

A resposta reside no nosso propósito pessoal. É o porquê de fazermos o que fazemos, do jeito que fazemos. 

Para encontrar nosso propósito, só mesmo escavando nosso próprio interior, esse território selvagem e cheio de matéria-prima que muitas vezes negligenciamos para continuarmos reproduzindo o que vimos numa tela.

Qual é meu propósito? Qual é meu objetivo com tudo isso?

Foda, mas não se acha resposta pronta pra isso no Google.


Texto originalmente publicado em junho de 2018 na edição #22 de Uma Newsletter.

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